A Justiça Federal anulou o relatório de inteligência financeira que embasou uma das frentes da Operação Sem Desconto - a investigação sobre fraudes no Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).
O documento produzido pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) colocou a Polícia Federal no rastro de lobistas e empresários suspeitos de envolvimento nos golpes contra aposentados.
A decisão foi tomada no inquérito sobre a Associação dos Aposentados Mutualistas para Benefícios Coletivos (Ambec), a pedido dos advogados Bruno Borragine e o Daniel Bialski.
A associação nega envolvimento com as fraudes. Entre os investigados estão o empresário Maurício Camisotti, descrito como "figura central" do esquema, e Antônio Carlos Camilo Antunes, o "careca do INSS", apontado como lobista do esquema.
Foi decretada a nulidade do relatório e de "eventuais provas decorrentes". Com isso, o documento deve ser excluído do inquérito em curso na Justiça Federal em São Paulo e a investigação poderá seguir apenas com "os dados e informações obtidos pelas fontes independentes".
Inicialmente, o relatório do Coaf tinha como foco a associação Amar Brasil. O documento foi compartilhado com a Polícia Federal antes da existência de um inquérito formal para investigar as fraudes envolvendo Ambec. Em seguida, a PF iniciou a análise dos dados sem autorização judicial.
O juiz Massimo Palazzolo, da 4.ª Vara Criminal Federal de São Paulo, considerou o procedimento irregular.
"Não obstante a medida investigativa seja imprescindível à descoberta de material útil à elucidação da investigação em curso, não pode este Estado-Juiz permitir a fishing expedition. Uma busca indiscriminada e ampla por evidências que poderá levantar questões éticas e legais sobre privacidade e abuso do sistema legal, seguido de vícios a investigação por violação de direitos e garantias fundamentais", diz a decisão.
Na prática, a decisão desidrata a investigação. A partir do documento, a PF mapeou uma série de movimentações financeiras suspeitas e conseguiu expandir a rede de investigados.
A Operação Sem Desconto foi desmembrada. São mais de 2O investigações em curso no Ministério Público Federal com foco nas entidades suspeitas, distribuídas segundo a sede de cada associação. A decisão afeta apenas o inquérito 5008929-56.2024.4.03.6181, sob jurisdição do juiz Massimo Palazzolo.
Em 2019, o STF autorizou o amplo compartilhamento de informações da Receita Federal e do Coaf com órgãos de investigação, sem necessidade de expressa autorização judicial, desde que existam "procedimentos formalmente instaurados e sujeitos a posterior controle jurisdicional".
A Associação dos Aposentados Mutualistas para Benefícios Coletivos pediu o trancamento do inquérito, o que foi negado. O juiz justificou que "os dados probatórios aportados posteriormente à fonte inicial autônoma, exceto o RIF atacado, revelam-se plenamente issíveis, uma vez que não foram contaminados pela mácula da ilicitude". "Ademais, é certo que pelos trâmites de praxe, próprios da primeira fase da persecução penal - inquérito policial, a descoberta de outros elementos de informação referente ao fato investigado seria inevitável, o que também afasta a desconstituição do presente inquérito policial", escreveu.
Com a palavra, os advogados Daniel Bialski e Bruno Borragine
Os advogados da Ambec, Daniel Bialski e Bruno Borragine, afirmaram que a decisão de anulação do RIF, que desencadeou a investigação contra a Ambec é paradigmática pois, em um só tempo, reflete a orientação do STJ de que RIFs não podem ser, indistintamente, solicitados sem autorização judicial, e a orientação do STF (Tema990) de que RIFs não podem ser solicitados e escrutinados sem que exista, previamente, inquérito policial instaurado.
Para Bialski e Borragine, respeitou-se a forma e a garantia do devido processo legal, e essa nulidade refletirá em outras medidas policiais que foram tomadas após a obtenção ilegal do RIF.
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